quinta-feira, junho 25, 2009
Como publicar 4: autor feliz é o que tem contrato justo!
Vou agora falar da situação dos escritores para revistas infantis.
Desconheço a situação em outras editorias, mas na Globo (setor das revistas: Menino Maluquinho, Sítio do Picapau Amarelo e Turma do Cocoricó) posso falar um pouco.
Em 2007 fui convidada a participar do Workshop para escritores. Tava lá o Ziraldo, o Still, a Elvira, a Júlia Sapadaccini...
Tudo muito bem, tudo muito legal. Até que chegamos na vaca fria: o preço.
A situação dos escritores das revistas infantis é muito parecida (para não falar igual) a que os ilustradores enfrentam nos "grandes" grupos editoriais - que faturam muito com vendas de governo e mercado de didáticos e paradidáticos.
Nestas editoras - que muitas vezes acumulam milhares de autores na carteira (ilustradores inclusos), diferentes selos (e continuam crescendo e engolindo pequenas editoras), o ilustrador é "remunerado" em seus direitos com base em uma famigerada tabelinha que diz mais ou menos assim:
Capa - custa x;
PB - custa y;
cor - custa tanto...
E por aí vai.
Simplesmente é "esquecida" a relação inerente dos direitos autorais com TIRAGEM, MÍDIAS, REGIÃO, TRADUÇÕES... Sim... "esquecida". Pois é...
O ilustrador é contactado e informado de criará imagens que serão exploradas em um único título de livro impresso.
Assim sendo, a famigerada tabela, até que fica atrativa. Afinals é só um título... Sendo SÓ na mídia impressa, em português... até que dá para levar...
O ilustrador entrega as imagens, e aguarda sua remuneração. Um valor fixo sobre determinado uso. Afinal, são deles os direitos sobre sua arte. E é esta relação autoral do ilustrador com sua obra que o atrai para literatura, ainda mais que para outras áreas.
Mas... já adivinharam o final da história?
Um contrato chega (às vezes com certo atraso, às vezes não).
Alguns ilustradores até se assustam, pois não imaginavam que seria formalizado um contrato* , ainda mais um tempão APÓS finalizadas as artes!
Sabe aquela história da "esquecida" relação com TIRAGEM, MÍDIA,... pois é... agora a editora SE LEMBROU! E como lembrou! Pois no contrato vem tudo explicadinho, só que aquela história do "apenas um livro" mudou, agora o editor também quer INFINITAS TIRAGENS, TODAS AS MÍDIAS, POR TODO SEMPRE... com direito a deformar, cortar, subverter as artes, com direito a revendê-las, a coloca-las em super vendas... tudo SEM QUE O AUTOR DA ILUSTRAÇÃO RECEBA UM ÚNICO CENTAVO.
Para que os colegas escritores entendam melhor o drama dos ilustradores, isso é como se o seu texto fosse licenciado com base em um valor fixo, finito e pequeno. Por exemplo: R$ 50,00 por página. E depois, você perdesse completamente os direitos patrimoniais sobre o mesmo, e ainda visse seu texto ser adulterado, e até licenciado para outros editores (e aí sim, se lembrariam de fazer o contrato corretamente).
Pode até um bom negócio, a princípio, receber um valor fechado, e não o percentual como na prática com o escritor. Mas a longo prazo, é um prejuízo enorme, e logo você se descobre escravo do sistema, sendo obrigado a produzir cada vez mais, mais rápido e tão fragilizado economicamente, que se vê submetido a mais vil exploração, com preço cada vez menores e editores que lhe empurram "contratos padrão". (E é esse o atual ritmo de trabalho dos ilustradores).
O correto é receber com base na UTILIZAÇÃO. Este valor fechado deve corresponder também a limites fechados de utilização, e nunca cessão integral. O opção de cessão deve ser algo muito especial, e mais bem pago. Não por acaso a criação de personagens e logotipos em muito, mas muito mesmo, mais cara do que a ilustração editorial. Por que tanto o personagem (tipo mascote) quanto o logotipo se unirão à imagem institucional da empresa, são do escopo de propriedade industrial, a aí sim, é essencial a cessão integral e universal de direitos. Pois até redesenhos de marca podem ocorrer, quando a empresa deseja atualizar sua imagem.
Os abusos com os ilustradores de livros já acontece com seus colegas escritores das revistas de banca.
As tiragens mínimas desses exemplares de banca é de 100.000 (pelo menos este era o critério na Ediouro para que uma revista sobrevivesse na casa). Ok, suponha que sejam só 10.000. Ainda assim, o valor investido nos autores é ínfimo se diluído no total de impressos.
O escritor para revistas infantis recebe R$ 50,00 (em 2007) por página, sem nenhum vínculo empregatício, com cessão total de direitos e pior: não tem a menor garantia de que as histórias que escreveu serão publicadas (e consequentemente pagas). Ele pode ver seu trabalho do mês inteiro ser recusado e ele fica ali, uma mão na frente outra atrás.
Uma história que lhe pagasse R$ 500,00 (10pgs), em 10.000 exemplares custaria ao editor: R$ 0,05.
Imagine ainda o retorno com anunciantes!
Ou seja, contratar um bom escritor, um excelente ilustrador, CUSTA MUITO POUCO, e ainda assim nos massacram com contratos terríveis, e valores aviltantes.
O triste é o editor não desconfiar o quão isso é prejudicial ao seu próprio negócio!
Que pagasse bem, que firmasse acordos justos... Isso se reflete na qualidade da criação! Aliás, qualquer profissão, se bem valorizada, responde com maior qualidade e presteza (seja autor, professor, médico, policial...).
Voltando às revistas: canso de ver oferta tosca de editor de quadrinhos em que se baseia apenas no formato auto-destrutivo dos contratos de cessão integral aplicados em conjunto com valores absurdamente baixos. Lembro de um editor na Ediouro, que querendo iniciar um série de "alto nível" de quadrinhos de terror, ofereceu a uma talentosíssima colega minha valores que não daria sequer para cobrir as diárias da gentil moça que se dispunha a fazer a faxina da casa da artista. Ora, independente de faxina ser ou não trabalho que exija especialização, as ilustrações da moça seriam reproduzidas na base dos milhares, junto a pomposos anunciantes e espalhadas, revendidas, exportadas, e re-licenciadas a torto e a direito.
Bem, a moça recusou e até onde sei o editor deve estar ainda a cata de bons autores para sua super revista...
A artista bem que tentou negociar um contrato, ainda de forma super vantajosa para o editor. Ele manteria o preço, mas ela não abriria mão do controle patrimonial de suas artes. Mas, como a Ediouro tinha os tais "contratos padronizados", nada feito. Francamente, no meu entender, quem saiu perdendo mais foi o editor - pois se a ilustradora perdeu os trocados (que poderia cobrir facilmente fazendo faxina na casa da sogra) o editor perdeu milhares de trocados que ganharia quando o trabalho de alto-nível dela chegasse às bancas de todos país.
Vejam este email de um colega autor para sentir um pouco mais do drama:
"Creio que, tanto da parte dos ilustres ilustradores quanto da parte das editoras existe gente mal informada e gente que deixa pra lá... Duas editoras (não cito nomes, por uma questão diplomática) me declararam que NÃO FAZEM CONTRATOS COM ILUSTRADORES. Uma delas, quando me posicionei pela necessidade (leia-se obrigatoriedade), se mostrou receptiva e me pediu o modelo para o contrato. Talvez eu esteja sendo ingênuo, mas me pareceu apenas desinformação e apego a práticas antigas, ou seja, apesar de tudo, não percebi má-fé. Em compensação, descobri que uma das mais conceituadas editoras tem dois modelos de contrato, o primeiro para quem assina qualquer coisa e o segundo para quem esperneia. No primeiro, eles ficam donos e senhores das imagens por toda a eternidade. No segundo, o uso é atrelado à obra (livro, conjunto de texto e imagem), com tempo determinado. Aí é malandragem mesmo. Se colar, colou... Como o ilustrador desconhece a existência do segundo, acaba assinando o primeiro. E aí, dançou. " ( recebi em abril de 2008)
Resumo na ópera:
Maus contratos espantam bons autores. Se o escritor, o ilustrador perde ao não aceitar os contratos "padronizados", os editores perdem muito mais. Muito mais do que jamais saberão se nunca mudarem sua postura de apertar o orçamento justo na parte mais importante do livro: na autoria!!! A parte mais importante e também a mais "barata", pois ainda que investissem mais, que revertessem melhor os lucros aos autores, ainda assim seria bem menos do que ganhariam com o aumento da qualidade dos trabalhos e consequente vendagem dos títulos.
* Na falta de um contrato, o que ficará valendo já está definido na Lei dos Direitos Autorais: tiragem de até 3.000, uma edição apenas, apenas um formato ( o primeiro proposto), 5 anos de publicação.
Desconheço a situação em outras editorias, mas na Globo (setor das revistas: Menino Maluquinho, Sítio do Picapau Amarelo e Turma do Cocoricó) posso falar um pouco.
Em 2007 fui convidada a participar do Workshop para escritores. Tava lá o Ziraldo, o Still, a Elvira, a Júlia Sapadaccini...
Tudo muito bem, tudo muito legal. Até que chegamos na vaca fria: o preço.
A situação dos escritores das revistas infantis é muito parecida (para não falar igual) a que os ilustradores enfrentam nos "grandes" grupos editoriais - que faturam muito com vendas de governo e mercado de didáticos e paradidáticos.
Nestas editoras - que muitas vezes acumulam milhares de autores na carteira (ilustradores inclusos), diferentes selos (e continuam crescendo e engolindo pequenas editoras), o ilustrador é "remunerado" em seus direitos com base em uma famigerada tabelinha que diz mais ou menos assim:
Capa - custa x;
PB - custa y;
cor - custa tanto...
E por aí vai.
Simplesmente é "esquecida" a relação inerente dos direitos autorais com TIRAGEM, MÍDIAS, REGIÃO, TRADUÇÕES... Sim... "esquecida". Pois é...
O ilustrador é contactado e informado de criará imagens que serão exploradas em um único título de livro impresso.
Assim sendo, a famigerada tabela, até que fica atrativa. Afinals é só um título... Sendo SÓ na mídia impressa, em português... até que dá para levar...
O ilustrador entrega as imagens, e aguarda sua remuneração. Um valor fixo sobre determinado uso. Afinal, são deles os direitos sobre sua arte. E é esta relação autoral do ilustrador com sua obra que o atrai para literatura, ainda mais que para outras áreas.
Mas... já adivinharam o final da história?
Um contrato chega (às vezes com certo atraso, às vezes não).
Alguns ilustradores até se assustam, pois não imaginavam que seria formalizado um contrato* , ainda mais um tempão APÓS finalizadas as artes!
Sabe aquela história da "esquecida" relação com TIRAGEM, MÍDIA,... pois é... agora a editora SE LEMBROU! E como lembrou! Pois no contrato vem tudo explicadinho, só que aquela história do "apenas um livro" mudou, agora o editor também quer INFINITAS TIRAGENS, TODAS AS MÍDIAS, POR TODO SEMPRE... com direito a deformar, cortar, subverter as artes, com direito a revendê-las, a coloca-las em super vendas... tudo SEM QUE O AUTOR DA ILUSTRAÇÃO RECEBA UM ÚNICO CENTAVO.
Para que os colegas escritores entendam melhor o drama dos ilustradores, isso é como se o seu texto fosse licenciado com base em um valor fixo, finito e pequeno. Por exemplo: R$ 50,00 por página. E depois, você perdesse completamente os direitos patrimoniais sobre o mesmo, e ainda visse seu texto ser adulterado, e até licenciado para outros editores (e aí sim, se lembrariam de fazer o contrato corretamente).
Pode até um bom negócio, a princípio, receber um valor fechado, e não o percentual como na prática com o escritor. Mas a longo prazo, é um prejuízo enorme, e logo você se descobre escravo do sistema, sendo obrigado a produzir cada vez mais, mais rápido e tão fragilizado economicamente, que se vê submetido a mais vil exploração, com preço cada vez menores e editores que lhe empurram "contratos padrão". (E é esse o atual ritmo de trabalho dos ilustradores).
O correto é receber com base na UTILIZAÇÃO. Este valor fechado deve corresponder também a limites fechados de utilização, e nunca cessão integral. O opção de cessão deve ser algo muito especial, e mais bem pago. Não por acaso a criação de personagens e logotipos em muito, mas muito mesmo, mais cara do que a ilustração editorial. Por que tanto o personagem (tipo mascote) quanto o logotipo se unirão à imagem institucional da empresa, são do escopo de propriedade industrial, a aí sim, é essencial a cessão integral e universal de direitos. Pois até redesenhos de marca podem ocorrer, quando a empresa deseja atualizar sua imagem.
Os abusos com os ilustradores de livros já acontece com seus colegas escritores das revistas de banca.
As tiragens mínimas desses exemplares de banca é de 100.000 (pelo menos este era o critério na Ediouro para que uma revista sobrevivesse na casa). Ok, suponha que sejam só 10.000. Ainda assim, o valor investido nos autores é ínfimo se diluído no total de impressos.
O escritor para revistas infantis recebe R$ 50,00 (em 2007) por página, sem nenhum vínculo empregatício, com cessão total de direitos e pior: não tem a menor garantia de que as histórias que escreveu serão publicadas (e consequentemente pagas). Ele pode ver seu trabalho do mês inteiro ser recusado e ele fica ali, uma mão na frente outra atrás.
Uma história que lhe pagasse R$ 500,00 (10pgs), em 10.000 exemplares custaria ao editor: R$ 0,05.
Imagine ainda o retorno com anunciantes!
Ou seja, contratar um bom escritor, um excelente ilustrador, CUSTA MUITO POUCO, e ainda assim nos massacram com contratos terríveis, e valores aviltantes.
O triste é o editor não desconfiar o quão isso é prejudicial ao seu próprio negócio!
Que pagasse bem, que firmasse acordos justos... Isso se reflete na qualidade da criação! Aliás, qualquer profissão, se bem valorizada, responde com maior qualidade e presteza (seja autor, professor, médico, policial...).
Voltando às revistas: canso de ver oferta tosca de editor de quadrinhos em que se baseia apenas no formato auto-destrutivo dos contratos de cessão integral aplicados em conjunto com valores absurdamente baixos. Lembro de um editor na Ediouro, que querendo iniciar um série de "alto nível" de quadrinhos de terror, ofereceu a uma talentosíssima colega minha valores que não daria sequer para cobrir as diárias da gentil moça que se dispunha a fazer a faxina da casa da artista. Ora, independente de faxina ser ou não trabalho que exija especialização, as ilustrações da moça seriam reproduzidas na base dos milhares, junto a pomposos anunciantes e espalhadas, revendidas, exportadas, e re-licenciadas a torto e a direito.
Bem, a moça recusou e até onde sei o editor deve estar ainda a cata de bons autores para sua super revista...
A artista bem que tentou negociar um contrato, ainda de forma super vantajosa para o editor. Ele manteria o preço, mas ela não abriria mão do controle patrimonial de suas artes. Mas, como a Ediouro tinha os tais "contratos padronizados", nada feito. Francamente, no meu entender, quem saiu perdendo mais foi o editor - pois se a ilustradora perdeu os trocados (que poderia cobrir facilmente fazendo faxina na casa da sogra) o editor perdeu milhares de trocados que ganharia quando o trabalho de alto-nível dela chegasse às bancas de todos país.
Vejam este email de um colega autor para sentir um pouco mais do drama:
"Creio que, tanto da parte dos ilustres ilustradores quanto da parte das editoras existe gente mal informada e gente que deixa pra lá... Duas editoras (não cito nomes, por uma questão diplomática) me declararam que NÃO FAZEM CONTRATOS COM ILUSTRADORES. Uma delas, quando me posicionei pela necessidade (leia-se obrigatoriedade), se mostrou receptiva e me pediu o modelo para o contrato. Talvez eu esteja sendo ingênuo, mas me pareceu apenas desinformação e apego a práticas antigas, ou seja, apesar de tudo, não percebi má-fé. Em compensação, descobri que uma das mais conceituadas editoras tem dois modelos de contrato, o primeiro para quem assina qualquer coisa e o segundo para quem esperneia. No primeiro, eles ficam donos e senhores das imagens por toda a eternidade. No segundo, o uso é atrelado à obra (livro, conjunto de texto e imagem), com tempo determinado. Aí é malandragem mesmo. Se colar, colou... Como o ilustrador desconhece a existência do segundo, acaba assinando o primeiro. E aí, dançou. " ( recebi em abril de 2008)
Resumo na ópera:
Maus contratos espantam bons autores. Se o escritor, o ilustrador perde ao não aceitar os contratos "padronizados", os editores perdem muito mais. Muito mais do que jamais saberão se nunca mudarem sua postura de apertar o orçamento justo na parte mais importante do livro: na autoria!!! A parte mais importante e também a mais "barata", pois ainda que investissem mais, que revertessem melhor os lucros aos autores, ainda assim seria bem menos do que ganhariam com o aumento da qualidade dos trabalhos e consequente vendagem dos títulos.
* Na falta de um contrato, o que ficará valendo já está definido na Lei dos Direitos Autorais: tiragem de até 3.000, uma edição apenas, apenas um formato ( o primeiro proposto), 5 anos de publicação.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário